16 de dezembro de 2009

Quero ser pedra

     Lendo o livro Gramática Expositiva do Chão, do poeta Manoel de Barros, tive vontade de ser pedra. Pensei: “como fazê-lo quando já estou preso nesta jaula de carne, ossos e luxúria?”. A única solução para isto é ser poeta e criar um poema:

Pedra

Ser pedra
é estar descascado de conceitos,
sendo coisa nas coisas,
braço de mundo na pureza
do que ainda não caiu em palavras.

22 de novembro de 2009

Um olhar poético sobre o educar: da habitação à morte*


Educar é morar, residir permanentemente no devir de um caminho de apropriação. Neste sentido, educar não é dizer como, mas apontar a partir de uma existência o metamorfosear entre externo e interno: consumação.
É necessário que se rompa a tradição baseada na retórica vicejante da quase-incorruptível relação sujeito-objeto. Nesta perspectiva, há aquele que ensina assim como aquele que é posto a aprender. Há um alguém que conduz para a predileção do domínio e, para a outra parte, sobra apenas a afirmação ou a conquista de algo que não lhe faz sentido por não ser seu originariamente.
Educar é encorpar, fazer nosso o que já é nosso. Assim, um autoapropriar-se na travessia que se apresenta misteriosamente. No entanto, misterioso aqui não se reduz à ficcionalização metafísica de um modelo formal, mas conduz ao transbordamento de corporeidade. Pois o mistério é o arcabouço do porvir e, por desdobramento, o berço da educação. Tomar corpo não é aparentar um sistema orgânico. Corpo é mais do que organismo, pois não se reduz a sistemas. Podemos dizer ser a unidade em que qualquer antagonismo é deposto de seu lugar de oposição para acolher a dissipação de polaridades. Desta maneira, o corpo é um todo que se plenifica em cada detalhe de suas partes.
A educação virou discurso volitivo, sujeição política, externalização do outro no transeunte da língua. Porém, como dizer ao outro o que não lhe pertence? Tentativas são feitas e o caminho vai seguindo... Como dizer da felicidade de alguém se não somos o outro? Faz-se uma representação do que é mais aprazível e aceitável, ficando o educar, nesta dimensão, como a metáfora do horário nobre popular.
O verbo educar deveria ter o significado de trazer a experiência da escuta para nosso próprio, isto é, para nosso modo de ser. Uma observação profunda que leva a uma auto-observação, autoescuta, auto-olhar, enfim, toda a possibilidade de experiência singularizada. É como o poeta que se apropria de si em cada verso, em cada obra que lança ao horizonte da leitura.
Neste movimento de incorporação, ler é ser a autoexperiência da humanização e educar, a consumação da convergência das diferenças no diálogo. Mas, para que isso aconteça, é fundamental uma disponibilização do homem à abertura de si mesmo, pois o que mais nos assusta é a possibilidade de nos descobrirmos para além daquilo que nos foi determinado como a aparência do que somos.
A tomada de contas do que somos mora na educação. E isso parece distante de se conceber se olharmos pela janela da nossa aparência, já que a educação virou uma afirmação daquilo que não nos pertence. Um encadeamento esquisito de conceitos e fórmulas...
Por mais que se tente enquadrar o homem nos bons modos da exatidão científica, haverá sempre uma brecha para o que é mais radical na vida: a morte. E esta não está no fim da linha como se supõe a linearidade moderna de percepção do real, mas vigora em todo instante como possibilitadora de todo viver. Morte não é apenas fim biológico, mas possibilidade de vitalizar, de fazer viger a circularidade poética de existir, pois, como diz Clarice Lispector em Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres: “É uma naturalidade morrer, transformar-se, transmutar-se. [...] Morrer deve ser um gozo natural. Depois de morrer não se vai ao paraíso, morrer é que é o paraíso”. Portanto, educar é morrer.

*Texto originalmente publicado na Revista Educação Pública.

3 de novembro de 2009

A invenção das ilhas – antologia poética de Virgílio de Lemos


No dia 27 de novembro agora, sairá em Maputo (Moçambique) o novíssimo livro de Virgílio de Lemos, intitulado A invenção das ilhas – antologia de Virgílio de Lemos. Com organização, posfácio e revisão de António Cabrita (poeta, autor de contos, crítico de cinema e de literatura) a antologia será publicada pela Escola Portuguesa de Moçambique – Centro de Ensino e Língua Portuguesa.
Segundo o próprio Virgílio, esta obra trará poemas inéditos que não constam do livro Eroticus moçambicanus (1999), organizado por Carmen Tindó. A importância deste último foi a de apresentar ao Brasil a poética virgiliana, evidenciando a grandiosidade de versos que reúnem em sua musicalidade e inaugurabilidade uma alquimia de imagens, sons e cheiros próprios. É o que vemos, por exemplo, no poema:

A tragédia e a língua
(Ao Luiz de Camões e ao Fernando Pessoa)

Fora ou dentro, a língua é luz
da alma, sendo seu próprio corpo
vegetal. Na folha em branco
passeia-se o nada recriado.

Sol, sendo luar, no desvelar reside
o segredo do criar, e na paleta
esquecida, vive ainda o morto,
duplo mergulho no texto e na deriva.

E é face ao mesmo mar de teus anseios
que neste outro olhar recrio o gesto
e reconcilio a tragédia e a língua.

(Do livro Eroticus Moçambicanus, pp. 67-8)

Agora é esperar que A invenção das ilhas saia o mais rápido possível também aqui no Brasil e que sejamos presenteados tão logo com uma provável imensidão poética de vertigem e caos.
Enquanto isso, adianto aos amigos leitores o texto da quarta capa do livro:

Virgílio de Lemos, poeta, antropólogo e jornalista moçambicano nasceu em 1929 na ilha de Ibo.
Impulsionador do movimento literário moçambicano nas décadas de 40 e 50, foi um dos criadores da folha-de-poesia Msaho (contemporânea do movimento Négritude de Césaire e Senghor), que procurou enaltecer as culturas locais e criar uma poética moçambicana, em ruptura com os modelos literários impostos pela colonização.
Absolvido de um processo judicial por crime de desrespeito à bandeira portuguesa, devido a um verso escrito em 1954 pelo heterônimo Duarte Galvão. Virgílio de Lemos exilou-se, e em 1963 passou a viver e a trabalhar em Paris, onde foi um conceituado jornalista de televisão e rádio.
Destacam-se, na sua obra, escrita tanto em português como em francês, Poemas do tempo presente (1960), obra apreendida pela PIDE, L’Obscene Pensée d’Alice, Ilha de Moçambique: a língua é o exílio do que sonhas, Negra Azul, Eroticus moçambicanus, Para Fazer um Mar, L'Aveugle et l'Absurde, La saignée de l'indicible e L'Écart du temps.
Sendo um dos vanguardistas da lírica moçambicana e defensor do conceito do “barroco-estético” para as literaturas de língua portuguesa, tem uma escrita poética fragmentária, sintética, eivada de imagens surrealistas, e duma dimensão cósmica, perpassada pelo onirismo, as problemáticas existenciais e o erotismo; que nunca descura a fidelidade aos homens e o seu testemunho.

25 de setembro de 2009

Dicionário de Poética e Pensamento

Será realizado no dia 29 de outubro, no auditório G1 da Faculdade de Letras da UFRJ, às 9 horas, o evento de lançamento do Dicionário de Poética e Pensamento.

Sob autoria e edição geral do titular de Poética da UFRJ, Prof. Dr. Manuel Antônio de Castro, este dicionário não almeja a elucidação de conceitos, conforme já funcionam os demais dicionários. Ao contrário, sua proposta é a de levar o leitor (internauta) a questionar, fazendo-o imergir na profundidade do pensamento, uma vez que os verbetes trazem caminhos a serem trilhados e nunca definições pontuais. Ou seja, com citações bibliográficas de obras literárias ou críticas, com a elaboração de reflexões por parte do Prof. Manuel e/ou dos editores, ou ainda com a mescla destas duas modalidades de elaboração dos verbetes e fichas, o Dicionário de Poética e Pensamento ganha fluência e dinamicidade ao nos presentear com possibilidades e não com certezas.

Por ser gerado na internet a partir do software colaborativo wiki, o dicionário está em constante crescimento com a inserção contínua de novos verbetes ou fichas. Porém, somente os editores podem fazê-lo, o que não impede que os usuários possam dar sugestões, tirar dúvidas ou se manifestar como quiserem ao acessar a seção "Fale conosco".

Este é o convite oficial de lançamento:



Para saber mais, além de visitar a página do Dicionário de Poética e Pensamento, veja também a matéria que o jornal eletrônico da UFRJ, o Olhar Virtual, fez ao entrevistar o Prof. Manuel de Castro, clicando em http://www.olharvirtual.ufrj.br/2006/index.php?id_edicao=268&codigo=7


21 de setembro de 2009

Verso...

Um verso...

Coluna vertebral do silêncio,

amálgama que costura o horizonte de todo poeta

na soleira entre o dizer e o calar.

Sendo fino, raso, profundo, denso,

sua estrutura ressoa formal ou livremente.


Na forma, vislumbra a colheita da palavra trabalhada:

métrica, rima, música cadenciada em sopro como respiração.

Na seriedade de sua liberdade,

convoca a ilusão do deboche rijo:

espreita os passos largos de uma andança milimetricamente

[desarrumada.


Um verso acalenta a sofridão da ausência,

um verso infringe a apatia da presença;

trova na união dos contrários

a valente postura de um lancinante ponto final.


Pausa. Pulmões inflados.

E a boca derrama tudo aquilo que se queria calar em um beijo.

Um verso beija, sangra a mão de quem o possui.

Ter um verso é ter a morte rasgando a pele e dizendo a vida.

A escritura do corpo é o limiar da corporeidade poética.

O corpo é um verso sendo escrito.

15 de julho de 2009

Corpo e aprendizagem: a educação em questão*

* Este texto está publicado na revista Educação Pública

[...]
De ênfase e tremor banha-se a vista
ante a luminosa nádega opalescente,
a coxa, o sacro ventre, prometido
ao ofício de existir, e tudo mais que o corpo
resume de outra vida, mais florente,
em que todos fomos terra, seiva e amor.
[...]

Carlos Drummond de Andrade – “Metafísica do corpo”



Tratar do corpo é sempre um desafio empolgante. Entusiasma a possibilidade de entrarmos em contato com algo que nos é ao mesmo tempo tão próximo e distante. Tocamos e sentimos o corpo, no entanto não dimensionamos sua complexidade. Circundado de mistério e pele, eis a aprendizagem da corporeidade: um mergulho no que temos de mais nosso e mais outro.
A aprendizagem, quando dialogada intimamente com nossa habitação corporal, se resplandece inacessível a teorias puramente acadêmicas. Avulta e esvai o toque do porvir, isto é, encerra numa desmedida infinda o caminho da consumação que é aprender. E este, verbo conjugado com seu pseudoavesso, não pode vir só, não dá conta da mundividência experiencial de estar vivo e em correspondência com o real. Aprender e ensinar: duplo domínio da apropriação humana de ser e existir.
A educação, podemos dizer, é esse caminho em que se perdem as retilíneas palavras de ordem. Mais ainda, instaura toda uma complexidade de maturação e maturidade referente à convivência com o diferente, com o além-das-quatro-paredes de uma sala de aula, enfim, com o mundo enquanto transbordamento da realidade imediata. Por isso, por ser rica em realizações, a educação nos enseja o exercício do pensamento apresentado neste texto.
Tamanha é a capacidade de a educação se mostrar tão diferentemente que nos é permitido trilhar trajetórias que, a princípio, se apresentam destoantes, contudo convergem para o vigor de sua essencialidade. Assim, nos é possível uma tessitura multiperspectivada em que poesia, filosofia, cheiro, toque, corpo e aprendizagem são possíveis sem causar danos à aclamada coerência de uma língua beatamente profana ou profanamente beata que é a Língua Portuguesa.
Partimos do descostume, retirando da palavra seu lugar comum: o corpo se corporifica em sua aprendizagem de ser, a aprendizagem se desaprende na corporalidade de ensinar, a educação – terra que resguarda cada um de nós – nos oferta a possibilidade de ir e vir nas peias de sua imensidão.



Desacostumando o sentido comum de corpo e aprendizagem



Como se dá a relação entre corpo e aprendizagem na educação? Eis uma questão fundamental que precisa ser estudada com cuidado. No entanto, de nada adiantará se não houver uma compreensão do que sejam corpo e aprendizagem em suas dinâmicas essenciais. Neste caso, antes de pensarmos a relação com a educação, dialogaremos, ainda que brevemente, com o sentido poético-filosófico dos termos supracitados.
Ao mencionarmos o poético não nos reportamos à produção textual de poemas ou a obras literárias, mas ao agir originário, portanto, à poíesis. Ao tomarmos tal atitude, poderemos pensar o corpo e a aprendizagem superados da utilidade prática ou estética (no caso do corpo) tão enfatizadas nos discursos. É uma tentativa de apreender o corpo como reinvenção corporal em sentido e verdade, à luz do pensamento grego; e a aprendizagem como consumação do aprender, isto é, apropriação contínua do átimo de passagem entre não-saber e saber.
A acepção mais comum que temos de corpo é aquela dada em sua oposição com alma: um organismo bifurcado. Esta perspectiva nega o corpo ao afirmar a alma e esta, por sua vez, ao ser negada, afirma o corpo. Assim, temos a ratificação da modernidade instaurada por Descartes quando a unidade do corpo foi separada numa dualidade opositiva: a res cogitans (o raciocínio) e a res extensa (a matéria). No diálogo poético, entendemos que “corpo seria, pois, cooriginário com vida ou o mesmo de vida” (Fogel: 2009, p. 36). Isto significa que o corpo é uma concrescência fenomênica, ou seja, a pulsação de vida em cada gesto, a consumação da história na experiência da existência humana.
O corpo é um “entre” que congrega em sua permanência a tensão entre percepção (nous) e sensação (aísthesis). Nesta relação, há uma copertinência em que uma realidade é inaugurada em sua mútua interpelação perceptivo-sensorial. Esta movimentação do real assinala a dinâmica do velar-auto-velante da realidade enquanto verdade, portanto, como alétheia. Melhor explicando, temos o corpo como interação entre a percepção – que capta e vê a essência das coisas – e a sensação – que revela uma experiência de constituição do saber para além do que os sentidos disponibilizam (Cf. Heidegger: 2007, p. 204; p. 251). A experiência que temos com os sentidos se configura como presencialidade, isto é, eles nos conduzem àquilo que se apresenta à visão, logo, percebemos tudo que sentimos. Por isso, a separação entre percepção e sensação, ideia e representação, não pode ser aceita como determinação conceitual. Esta relação explicita a afirmação da leitura cartesiana, cujo empenho se solidifica na tradição filosófica, fortemente cravejada pelo encaminhamento retórico-sofístico: “Kant, no rastro de Descartes, separa o que jamais houve separado e, então, por isso, depara-se com a tarefa de reunir, de sintetizar o que jamais se separou ou houve separado” (Fogel: 2009, p. 54).
O pensador originário Heráclito de Éfeso, em seu fragmento 50, já convocava a unidade manifestada na complexidade do corpo: “Auscultando não a mim mas o lógos, é sábio concordar que tudo é um” (Heráclito: 1991, p. 71). Ora, esse “tudo é um” invita a vigência das diferenças que fundam a identidade de um ente. Neste caso, podemos relacionar a luminosidade corporal de o homem ser, ao mesmo tempo, organismo biofisiológico e habitação do porvir histórico-existencial. Sendo que existência aqui nos remete à presença, ou seja, aquilo que se mostra à visualização.
Podemos fazer a relação entre corpo e aprendizagem na medida em que entendemos que o corpo é um movimento de consumação de sua deveniência histórica e que aprendizagem é a apropriação do que nos é próprio. Em outras palavras, esta apropriação de apreensão é inerente à aprendizagem, posto que não aprendemos o que vem de fora, mas trazemos ao recolhimento de nossa travessia aquilo que estava velado na potencialidade de nosso existir enquanto não-aparecimento, portanto, o que ainda não se apresentou.
A aprendizagem reclama em sua vigência um encaminhamento experiencial. Se dialogarmos com o sentido grego, entenderemos este processo pelo radical mantháno, isto é, um duplo movimento de ensinar e aprender no qual o ínterim desta dinâmica resguardava a aprendizagem como possessão: “Aprender-e-ensinar é pois a identidade e diferenciação de nossas diferenças com a realidade, tanto com a realidade que nós mesmos somos, como com a realidade que nós mesmos não somos” (Leão: 1977, p. 49).
Não estamos acostumados a prestar atenção ao que não somos, porém só podemos ser o que somos porque – e inevitavelmente – estamos em plena realização do que não-somos. O problema é que já estamos tão inseridos num mundo cujas experiências apontam à obtenção de certezas, que a ciência e sua necessidade de dizer o que é, sem, em muitos casos, não se virar ao que não é, se posicionou como a realidade preponderante.
Estamos trilhando em apontamento ao homem, haja vista que não poderemos partir de nenhum lugar que não seja da realização do humano no homem. Enquanto homens, somos a tensão entre vida e morte tocados pela figuração autopoética de ser. Esta autopoiese reclama tanto o movimento de apropriação inerente à aprendizagem (autós) quanto à dimensão poética de acontecer (poíesis), isto é, simultaneamente afirmamos nossa identidade no fluxo das diferenças e nos entregamos ao devir que é existir. Neste sentido, a educação deflagra o ambiente no qual estas tensões se reúnem especificamente e engendram a relação com as questões de ensino e aprendizagem à luz da criticidade poética.
Corpo e aprendizagem se entremeiam na medida em que se tornam questões. Corpo como questão deixa de ser um conceito fixo para se dar como insurgência continuamente inaugural de pensamento. O mesmo acontece com a aprendizagem, pois rechaça a estaticidade própria da aplicação conceitual e insufla de possibilidades de trânsito um sem-caminho meramente teórico.
A educação ganha corpo e se manifesta como aprendizagem, torna-se uma questão primordial cuja trajetória redimensiona a maneira de se lidar com as situações próprias de seu cotidiano. Afinal, se “a educação é um lugar onde toda nossa sociedade se interroga a respeito dela mesma” (Gadotti: 2004, p. 43), devemos fundamentalmente fazer jus ao sentido de apropriação do que somos enquanto corpo na vigência da aprendizagem, percebendo a educação como questão. Há aí o ensejo à autoescuta, isto é, para que pensemos a autointerrogação mencionada na citação acima, é necessário que antes olhemos para nós e, a partir de nossa constituição poético-telúrica, consigamos nos desdobrar no que assumimos como a nossa habitação. Isto quer dizer que somos diálogos em concrescência, posto que crescemos junto com as questões que em nós irrompem.



Uma política poética para a educação



Um dos problemas da educação, poderíamos propor e pensar, é que ela é vista como área disciplinar, presa à sala de aula. Enquanto a educação estiver restringida pelos “teóricos das escolas”, sua retórica de limitação continuará se desenvolvendo. Em outras palavras, o ato de educar transpõe mera atitude de dizer o que é algo, isto é, não se encerra num movimento de trazer para dentro uma experiência externa, conforme já dissemos ao discutirmos a aprendizagem. Neste sentido, educação não pode ser vista a partir de uma ótica serviente na qual não se prescinde de um uso, de uma finalidade.
Retomando Gadotti, quando discute o papel da filosofia e da educação relacionadas com o homem (Cf. 2004, p. 63), ele explicita uma necessidade de porquês, pergunta pela utilidade da educação e seu dimensionamento no homem. Ora, esta trajetória desimplica a educação de sua vigência corporal e desdobrada na aprendizagem enquanto questões para definir uma função, ou como se evidencia em seu texto, uma práxis. De certa forma, podemos dizer que ele engendra uma autocontradição que, no entanto, não é incoerente com sua proposta, mas realoca a educação e, no caso, a filosofia, na tradição retórico-sofística que até então se afirma no percurso da modernidade à pós-modernidade. Apesar destes dizeres, não intencionamos avaliar a conduta do autor citado, até porque seus encaminhamentos enriquecem nosso diálogo, à medida que trazemos para o âmbito do incurso poético-ontológico a explanação pedagógica de uma educação prática – haja vista algumas diferenciações feitas entre um filosofar meramente reflexivo e um “engajamento real” (p. 50). Então, supomos que este real esteja na dimensão do que seja concreto e que, por vez, este concreto se reduza à materialidade, ao sinônimo de continente de massa.
A educação não pode figurar no patamar da concretude material, mas no de concretude poética – conforme já tratamos anteriormente, logo, enquanto movimento da poíesis. Este modo de encorpar a educação traduz uma apreensão do próprio do educar, ou seja, aquilo que se apresenta como questão imanente da educação e que em nós brilha, mas se mantém ofuscada nos calabouços da retidão social.
A sociedade, como entendemos – e cremos se ramificar na ruminação acrítica –, é o carrasco da formalização. Aponta os bons costumes e molda a inocência infantil na famigerada deturpação adulta de racionalização do imaginário. Eis o senso comum educativo: a formatação nas leis de convivência política. A questão, no entanto, que ficou obliterada foi que se deixou de pensar o político enquanto envio do real. Aqui a pólis se reduziu ao partidarismo, ao político como manutenção ideológica de esquerda ou direita. Por mais que ainda se entenda o político como um modo de organização da sociedade, este perde sua densidade quando se estabelece como detentor dos modos de representação de permanência no convívio com o outro, sem que se entenda o próprio do educar.
A aprendizagem é trocada pelo aprendizado, pela imediatez dos resultados. Embora pareça uma redundância isso que acabamos de dizer, quando prestamos atenção ao que as palavras silenciosamente nos dizem, percebemos o mundo que deixamos de abraçar por sermos constantemente desatentos, por não sabermos escutar. Assim, seguindo o encaminhamento que propomos para este texto, podemos pensar que, diferente de aprendizagem, aprendizado é o já posto conceitualmente e que obedece a um estatuto de sujeição, ou seja, é o quantitativo absorvido e “somado” ao conjunto de saberes do indivíduo. Então, pode-se até se ensinar o saber, mas nunca a sabedoria, como nos diz o poema:



A ciência pode classificar e nomear os órgãos de um sabiá
mas não pode medir seus encantos.
A ciência não pode calcular quantos cavalos de força existem
nos encantos de um sabiá.

Quem acumula muita informação perde o condão de
adivinhar: dinivare.

Os sabiás divinam.
(Barros: 1998, p. 53)



Uma perspectiva para se pensar...



A partir do que traçamos no decorrer deste trabalho, podemos criticar a educação como uma prática material, como o resultado de implementações burocráticas. Logicamente que estas esferas são importantes à constituição do pensamento em relação ao educar, só não podem ser a única faceta de sua realização. Do contrário, o corpo é esquecido e posto como argamassa biológica; a aprendizagem se iguala ao aprendizado e se reduz ao acúmulo intelectual.
Pensar o corpo e a aprendizagem na dinâmica educacional é bastante difícil. É um percurso extremamente denso e nos exige, primordialmente, autoescuta. Saber ouvir e conviver com as experiências que nos fundam e nos aprofundam humanamente significa a assunção da liminaridade de ser homem e concrescer em sociedade. A permanência do poético no gestual do corpo inaugura uma aprendizagem essencial no diálogo com a educação. O corpo deixa de ser depositário da alma, ou mesmo seu contrário; a aprendizagem galga o fluxo contínuo de ensinar e aprender na plenificação experiencial de ser, e assim, o real acena e se ordena de múltiplas maneiras, revelando realidades que se interpenetram e configuram as modalidades de apresentação do cotidiano.
Enfim, a educação retoma continuamente a questão do humano ao passo que eleva o corpo e a aprendizagem enquanto caminhos de apropriação do que a nós sempre pertenceu. Eis uma pertença originária que funda os descaminhos específicos do ensinar e aprender, isto é, originário porque origina continuamente os caminhos enviesados da educação numa perspectiva poética e concernente ao indizível do existir.



Referências



ANDRADE, Carlos Drummond. “Metafísica do corpo”. In: Corpo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Record, 1984.
BARROS, Manoel de. “9”. In: Livro sobre nada. 6ª ed. Rio de Janeiro: Record, 1998.
FOGEL, Gilvan. “Notas sobre o corpo”. In: CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Arte: corpo, mundo e terra. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009.
GADOTTI, Moacir. Pedagogia da práxis. 4ª ed. São Paulo: Cortez; Instituto Paulo Freire, 2004.
HEIDEGGER, Martin. Ser e verdade: a questão fundamental da filosofia; da essência da verdade. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Petrópolis: Vozes; Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2007.
HERÁCLITO et alli. Os pensadores originários: Anaximandro, Parmênides e Heráclito. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Petrópolis: Vozes, 1991.
LEÃO, Emmanuel Carneiro. “Aprender e ensinar”. In: ______. Aprendendo a pensar. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1977.



8 de maio de 2009

Um caso de poema perdido

O trânsito das ruas e as vielas do pensamento insurgem obscuras na algibeira do acaso. Nenhum negrume, verme encaixotado, se alarga na dimensão do horizonte. Este, linha que costura a infâmia do vir-a-ver, surpreende o mais atento encarnado de fábulas e objeções; pega o repentino momento de aclaramento das ideias e zapt: o espanto toma o poeta e convoca o nascimento trágico de ser!


Para além das ontologias des-dizentes o poema se coloca firme ante a voz. O alumbramento da fala encara o silêncio no anteparo da razão... Esta, coitada, esvai-se em conceitos e deturpações subjetivas... Um caso de poema perdido, uma sala ocupada de nada: o ventre livre e cheio de nascividade.


O poeta atende ao chamado e se põe a falar: canta o canto musal em plenitude de memória. Mnemosýne e Musas numa orgia de versos, gestos e silêncio. Thaumadzein!... E o poeta irrompe em mundo! A poíesis coloca-se no incesto do dizer, pois doa e retira a fala de sua boca num aletheiamento inesgotável de sagrado e profano: circulares movimentos de velo e desvelo: consumação.


Consuma-se a fala na linguagem, consuma-se o rio no mar... nos consumamos em ser o que somos no apelo ao sagrado:


A espantosa realidade das coisas

É a minha descoberta de todos os dias.

Cada coisa é o que é,

E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra,

E quanto isso me basta.


Basta existir para se ser completo.


(PESSOA, Fernando. “Dos poemas inconjuntos”. Poesia. 5ª ed. Rio de Janeiro: Agir, 1970, p. 66)

11 de abril de 2009

Palavrar é estar em conluio com o diabo!

Só para completar a informação do post anterior (claro, e ir além de mera propaganda!), saiu no dia 14 de março o livro Universo Paulistano - contos, crônicas e poemas de uma cidade que nunca dorme. Contudo, a intransigência de um tempo cronológico aproximado da conjuntura cósmica que me entorpece resultaram no atraso do comentário, assim como ao meu sumiço deste ambiente blóguico. Mas já que aqui finalmente estou, vamos à palavra. À palavra?

Sim, vamos ao lugar do desapropriado senso de matéria. Aonde o corpo é verbal e carnal na boca de quem pronuncia o zelo de pensar. A palavra é a poesia que gera não só poemas, mas possibilidades de errâncias. A palavra é o que nunca sei ao dizer, mas digo porque sou palavra (no salto mortal à escuridão do nunca sabido dia de amanhã).

Caindo de um cume cuja morada é o chão, a queda balbucia o gesto de criação e se refestela no sólido e impreciso destino de esborrachamento. Sim! Palavrar é esborrachar! Destroçar qualquer mísero pedaço de angústia na boquiaberta dentição da morte: morrer é viver, é palavrar.

Palavrar é transitar, estar em conluio com o cramulhano, com o barzabu, com o coisa-à-toa. Sim ele mesmo! Palavrar é estar em conluio com o diabo! O que não significa que firmei um pacto de alma, mas um pacto de vida. O diabo, ao contrário da palavra já estabelecida enquanto conceitualmente malvado, é o próprio trânsito, o próprio movimento de viver e dialogar. Não precisamos ir aos academicismos etimológicos, mas solto a deixa de que precisamos nos desacostumar da palavra argamassada num sentido comum e único. Deus? Claro, a brincadeira dos campos semânticos exige a presença do suposto contrário... que nada... juntos são um e o mesmo na circularidade de ser e não-ser: Tao.

A palavra aqui me trouxe e daqui me leva para outro agora. O tempo na dimensão de sua totalidade: a constância do agora, do aqui-mesmo... Mas antes, claro, não posso deixar de convidá-los ao agulhamento deste pensar (ou pesar papo-furado): ao poema, à palavra despaginada e reconfigurada na diversidade dos suportes: eis o dito-cujo presente no livro acima mencionado:

Lembranças que não tenho

São Paulo.
Só conheço no papel.
Páginas encardidas de vapores sólidos.
Suas ruas,
infames deturpações imaginadas.
Suas praças,
um passado que não é o meu.

São Paulo.
Uma cidade.
Capital.
De quê?
De quem?
De um sonâmbulo
que da janela entreaberta da inércia
só respira o tédio,
o transe
sem trânsito.

São Paulo:
Minhas recordações.
Te desconheço.
Suas curvas
não me entorpeceram.
Suas putas
nunca me comeram.

São Paulo.
Uma terra que não conheço,
uns jardins que para mim nunca existiram,
flores que nunca colhi.
Cidade.
Capital.
De quem?
De ninguém.

5 de fevereiro de 2009

Poema publicado em antologia


Em breve sairá a antologia Universo Paulistano - contos, crônicas e poemas de uma cidade que nunca dorme, pela editora Andross, na qual terá um poema meu. O lançamento está previsto para março e será realizado em São Paulo.
Para quem não conhece o evento, eis algumas informações sobre a editora e o lançamento de futuros livros:

ANDROSS EDITORA SELECIONA TEXTOS DE NOVOS AUTORES

A Andross Editora está organizando sete antologias a serem publicadas ainda em 2009. Escritores interessados em participar da seleção já podem enviar seus textos. São vários gêneros literários (poemas, contos, crônicas e microcontos) de temáticas diferentes - de humor a suspense.
Podem participar autores iniciantes ou com obras já publicadas. O regulamento e instruções para envio dos textos estão disponíveis no website da editora: www.andross.com.br.
Veja a lista dos lançamentos da Andross Editora para este ano:


1. Palavras Veladas – Antologia de poemas
2. Risos de Papel – Contos e crônicas de humor
3. Dias Contados – Contos sobre o fim do mundo
4. Dimensões.Br – Contos de literatura fantástica no brasil
5. Histórias Liliputianas – Antologia de microcontos
6. Marcas na Parede – Contos sobrenaturais, de suspense e de terror
7. 2054 – Contos futuristas (histórias que se passem no ano de 2054)



Sobre a Andross

Com quatro anos de mercado e mais de 33 títulos publicados, a Andross Editora iniciou as atividades com obras acadêmicas, cresceu e se manteve no mercado graças a um modelo de negócio diferenciado: a publicação de antologias. Por este sistema, a editora já publicou mais de 780 autores de 13 a 68 anos, do ensino médio ao doutorado, amadores e profissionais. Alguns dos que estrearam nas antologias da Andross hoje têm obras publicadas individualmente por outras editoras.

Mais informações para a imprensa:

Edson Rossatto
Andross Editora
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13 de janeiro de 2009

Interpretação do poema "Retórica", de Octavio Paz



Retórica


1

Cantan los pájaros, cantan

sin saber lo que cantan

todo su entendimiento es su garganta.

2

La forma que se ajusta al movimiento

no es prisión sino piel del pensamiento.

3

La claridad del cristal trasparente

no es claridad para mi suficiente:

el agua clara es el agua corriente.


Numa postura de escuta atenta ao que o poema nos diz e nos incita a pensar, observaremos em sua forma a ambigüidade da negação. Ou seja, ao mesmo tempo em que o mesmo ajuíza em seu título a conformidade do pensar retido ao formato, as questões levantadas por ele esfumam tais certezas.

A palavra retórica conceitualmente nos leva ao entendimento tanto do bem falar premeditado a um fim quanto à verborrágica desmedida da redundância. Desta maneira, o poema ambigüiza o caráter convencional do enunciado com a desfeitura de seu sentido comum, pois quando nos debruçamos na estrutura tripartida do poema, lançamo-nos na dimensão do desencascamento por ele explicitada. Isto é, retiramos a “pele” do convencional para nos entregarmos à fala do poema em três momentos muito bem demarcados: a linguagem; o corpo; o pensamento. No desenrolar deste pequeno texto, observaremos mais calmamente os movimentos aqui cogitados.


1: a linguagem


Sem saber o que seja o canto, os pássaros simplesmente cantam. Corporificam no desentendimento de ser a plenitude de seu corpo sonoro: “todo su entendimiento es su garganta”. Nãorazão que determine o cantar, posto que este não precise de conhecimentos prévios para se realizar.

Neste primeiro movimento, a ruptura com o sentido comum que o título abarca é explicitada quando a necessidade de um conhecer racional é posta abaixo. Este conhecer racional é sempre posposto à coisa mencionada, haja vista a insurgência empírica como fundamento do saber moderno. A adequação de um enunciado com sua descrição perfeita convoca a verdade enquanto mecanismo maniqueísta, isto é, nãoambigüidade entre certo e errado. Estes são sempre a fronteira previamente estabelecida pela razão.

A negação que o poema eleva é o da ambigüidade, na medida em que o não-saber não é uma mera negação ao saber, ou seja, não é um movimento esvaziante de sentido. Muito pelo contrário, o não-saber é o que propicia a sapiência. Pois saber algo é morar na sua anterioridade, é ouvir o silêncio no qual residem todas as palavras ainda não ditas. A excessividade do silêncio doa todo o cantar e, no canto, o silêncio se fundamenta veladamente. A linguagem atravessa o homem (Cf. Heidegger: 1995); canto porque, antes, há linguagem e esta inaugura a fala a cada momento de sua enunciação. Assim, canto e silêncio acontecem exatamente no mesmo instante enquanto movimento circular de velamento e desvelo.


2: o corpo


Neste segundo mo(vi)mento, o poema galga uma outra etapa do desencascamento do racional.

A fim de situarmos nossa discussão, pensemos o sentido de pele: é aquilo que encobre o corpo e se ajusta à sua movimentação. Alarga-se, encolhe-se, sua, recebe o corte e sangra. Não age sozinho, mas segue o movimento do que se vela sob sua proteção. Contudo, pensando numa instância tátil, se não fosse seu abrigo, o corpo orgânico se esfacelaria. O poema conjunta a tradição da formalidade com a dinâmica da acontecência poética, isto é, os dois versos do segundo movimento acabam com a dureza de uma estrutura calcificada e a entregam à tensão de uma constante movimentação.

Se pensarmos na modernidade hispano-americana, poderemos perceber que a forma “no es prisión” não se restringe a um desenho estático, mas se desenha a cada traço rabiscado. Então, podemos também dialogar com o fato de que tal modernidade se funda numa oposição antiopositiva, exatamente por não se polarizar antagonicamente, mas se imiscuir na ambigüidade dos opostos que não se contradizem, e sim, complementam-se.


3: a clareira do saber e não-saber


Neste último movimento, a circularidade poética se faz evidente ao retomar a questão da primeira estrofe. A claridade não é o saber racional típico de uma era iluminista. Esta tradição é desfeita no jogo semântico entre a claridade do cristal (a razão) e a insuficiência de sua substância ao conhecer (o pensamento).

Se pensarmos pelo viés do saber empírico, a suficiência se dá quando uma medida previamente estabelecida é satisfeita; quando a adequação entre uma coisa e seu enunciado se acoplam perfeitamente. Mais ainda, quando a retórica se fundamenta na verborragia redundante de conceitos.

A imagem do cristal como representatividade racional é questionada no momento em que não ocorre a adequação: “No es claridad para mi suficiente”. A insuficiência se dá na necessidade imanentemente humana de sempre saber mais. E este saber não como acúmulo de conhecimento, mas como experienciação do imprevisto.

A claridade da água é contraposta à claridade do cristal para avultar a dinâmica supramencionada. Isto é, a primeira nos diz o trânsito; o sentido referente à dupla insurgência do que se mostra na luz e volta a se velar na escuridão. Eis a inconstância do poético quando em seu dizer originário (a poiesis) congrega o agir primordial. Ou seja, “o alcance, o sentido e a essência do agir. A esta os gregos denominaram poiesis” (Castro: 2005, 23).

Neste poema temos a desfeitura do convencional na simplicidade de três movimentos que, na particularidade de cada núcleo – o canto (linguagem), a corporeidade da forma e o saber (claridade) –, engendram a grandiosidade do pensamento poético.


Referências bibliográficas


CASTRO, Manuel Antônio de. Heidegger e as questões da arte. In: ______ (org). A arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005.

HEIDEGGER, Martin. Sobre o humanismo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1995.

PAZ, Octavio. Retórica. In: Condición de nube, 1944.